Em 2007, a Coca-Cola tentou emplacar no Norte do Brasil sua água
Aquarius, mas teve de abandonar a experiência depois de alguns meses. A
bebida, que tem prazo de validade de 90 dias, demorava quase um mês para
chegar a alguns destinos. Com isso, o tempo para vendê-la nesse mercado
era tão pequeno que não compensava o investimento de transporte. No
passado, outro produto da companhia sofreu com as intempéries da região.
Até o final da década de 70, a Fanta Laranja chegava ao Acre
descolorida.
Durante a viagem, o sol castigava tanto os engradados que
fazia a cor artificial do refrigerante desaparecer. O problema foi
resolvido com a inauguração de uma fábrica da Coca-Cola no Acre. Mesmo
assim, nos primeiros tempos de vendas, parte dos consumidores estranhou o
produto. “As pessoas chegavam no mercado e pediam a Fanta ‘branca’, que
era a que elas conheciam”, diz Antonino Araújo, que na década de 70
trabalhou como diretor do grupo Simões, empresa distribuidora da
Coca-Cola no Amazonas.
Em razão dos problemas enfrentados por terra e água, a distribuição de
cargas na Região Norte por transporte aéreo vem ganhando força como
alternativa, ainda que isso resulte em despesas maiores. Num percurso de
aproximadamente 1 000 quilômetros, que vai de Manaus até Parintins, por
exemplo, a entrega de uma encomenda de 100 quilos realizada por avião
custa 2 000 reais, o equivalente a 20 vezes o valor cobrado no
transporte fluvial. Muitas vezes, porém, a agilidade do serviço compensa
essa diferença de preço.
“Uma carga retirada do aeroporto de Guarulhos
às 20 horas estará em Manaus, já liberada para ser distribuída, por
volta das 10 horas da manhã seguinte”, afirma Marcus Sabino, executivo
de contas da companhia de transportes aéreos Atual, de Manaus. Para
gozar dessa agilidade, a filial brasileira da fabricante americana de
brinquedos Mattel embarca desde carrinhos Hot Wheels até as bonecas
Barbie e Poly de avião para a Amazônia.
Atualmente, a Mattel envia duas
cargas mensais de brinquedos, com 300 quilos cada uma, para Manaus. “O
desafio é não repassar esse custo extra com a distribuição para o
consumidor final”, diz Ricardo Roschel, diretor de operações da Mattel.
“O desempenho de vendas em estados como Amazonas e Pará tem sido muito
bom para a empresa, o que ajuda a equilibrar o custo da operação.”
Por causa da demanda de clientes como a Mattel, o mercado de táxi aéreo
da Região Norte anda bastante aquecido.
A Amazonaves, de Manaus, uma das
companhias que prestam esse serviço, dobrou seu movimento nos últimos
cinco anos com a entrega de insumos para a Petrobras e de bens de
consumo como roupas, cosméticos, bicicletas, produtos eletrônicos e
computadores para distribuidores locais. Mas se as rodovias sofrem com
buracos e as hidrovias com a falta de portos, o transporte aéreo padece
com as chamadas “zonas escuras”. “Somos desprovidos de informações de
Vôo, não existe nenhum apoio no interior da Amazônia para a navegação
aérea”, afirma Geraldo Picão, sócio-fundador e piloto da Amazonaves. Em
2002, um piloto da empresa fez um pouso de emergência numa área de mata
fechada e seu corpo só foi encontrado 90 dias depois.
Outra dificuldade é
com o abastecimento, já que, além da capital Manaus, apenas quatro
municípios – separados entre si por 3 horas de vôo – têm estrutura para
abastecer os aviões. “Voamos com aviões Caravan, que têm apenas 6 horas
de autonomia de vôo, o que é um complicador”, diz Picão.
No estado de
São Paulo existe um aeroporto para abastecer a cada 15 minutos, o que dá
uma idéia da aridez aeroportuária da Amazônia.
Com características tão peculiares, mesmo o transporte de uma garrafa de
refrigerante apresenta desafios na Amazônia quando o destino da entrega
é em localidades como Guajará, na fronteira do Amazonas com o Acre.
“Talvez esse seja o nosso destino mais complicado, a começar pela
distância”, diz Aristarco de Paula Neto, presidente do grupo Simões, que
distribui os produtos Coca-Cola na região. Partindo de Manaus, em linha
reta, seriam 1 300 quilômetros até Guajará, mas não há rodovia que
ligue as duas cidades.
A única rota possível é a fluvial, primeiro pelo
rio Solimões, depois afluentes cada vez menores até o rio Juruá – o que
resulta em 4 600 quilômetros da capital do estado até a cidade, a última
fronteira da Amazônia.
Apesar do uso intenso dos rios, eles nunca foram
devidamente mapeados e não existe orientação oficial quanto à
localização dos temidos bancos de areia, o que, não raro, causa
acidentes. “Já perdemos cargas inteiras com barcos que tombaram após
colisão com os bancos de areia”, disse Paula Neto. “No final das contas é
a experiência do nosso caboclo que faz a balsa chegar ao destino.” Portal Transporta Brasil